Em
1411 D. João I assina a paz com Castela. Depois de uma longa guerra surge
finalmente a paz com o único reino com que partilhávamos as nossas fronteiras.
Restava apenas o oceano e, foi para aí que o monarca português voltou as suas
atenções.
Em
1415 uma armada portuguesa conquista a cidade de Ceuta. Os motivos oficiais que
levaram a tal demanda prenderam-se essencialmente com motivos de ordem
religiosa. A conquista de territórios ao infiel em nome de Deus foi o
principal, havendo outros, como a necessidade de um feito militar para armar os
infantes em cavaleiros do reino. No entanto, forças mais poderosas
impulsionaram a expansão portuguesa em Marrocos. À partida, as pressões da
burguesia comercial e da nobreza. A primeira sempre ávida pelo lucro potenciado
na conquista de novos mercados e, a segunda, pelas mercês, senhorias e a
riqueza do saque que a paz lhes negava. A juntar a tudo isto temos a importância
estratégica da cidade, que influenciou a manutenção da mesma pelas forças
portuguesas. Ceuta providenciava apoio logístico de vital importância ao reino
de Granada, assim como aos piratas muçulmanos que muito prejuízo causavam a
Portugal. Ficaram desta forma protegidas as rotas marítimas
comerciais ibéricas e a actividade piscatória. Também foi tido em conta que a
presença portuguesa em Marrocos seria um entrave às pretensões Castelhanas aos
territórios a sul, ou que permitiria boas bases logísticas de apoio à futura
expansão atlântica. Também o fervor religioso no combate ao infiel as novas
oportunidades de comércio e corso, terá pesado na decisão de manter uma forte
presença portuguesa em Marrocos. Em suma, existiu uma conjuntura de interesses
económicos, de estratégia político-militar e religiosos que viriam a marcar não
só o início da expansão portuguesa em Marrocos, como também toda a história dos
descobrimentos portugueses.
Assistiu-se
pois, no período seguinte à conquista de Ceuta, à primeira etapa de integração
na chamada “expansão atlântica”. Nesta etapa estiveram em confronto duas
correntes, com dois protagonistas distintos, a nobreza e a burguesia. Aos
primeiros movia-os uma sede de conquista através da acção militar, aos segundos
o lucro da actividade mercantil.
A
D. João I sucede D. Duarte, que continua a apoiar a exploração marítima e as
conquistas em África. Figura fulcral nesta política foi o seu irmão, o Infante
D. Henrique que, fixando-se em Sagres articula e coordena as diferentes
expedições exploratórias de além-mar. O reinado de D. Duarte fica no entanto
marcado pelo desastre da expedição a Tanger em 1437, onde as forças portuguesas
foram derrotadas, deixando em cativeiro D. Fernando, irmão de D. Duarte. Este
viria a morrer em cativeiro. D. Duarte faleceu ainda antes deste, deixando nas
mãos de D. Leonor a regência do reino, uma vez que o seu sucessor, Afonso V,
tinha na altura seis anos.
O
conflito de interesses entre a nobreza e a burguesia pende decisivamente para o
terceiro estado ao forçar a entrega da regência do reino das mãos de D. Leonor
para D. Pedro, opositor de uma campanha militar continuada em Marrocos. Esta
etapa fica também marcada pala descoberta das ilhas da Madeira (1419) e dos
Açores (1427), assim como a passagem do cabo Bojador por Gil Eanes (1434). É
pois um período de consolidação através da exploração geográfica das novas
áreas como de inovações técnicas que permitiriam aos navegadores portugueses
uma boa base de partida para o futuro dos descobrimentos portugueses.
A
segunda etapa decorreu entre 1440 e 1449, ano em que faleceu D. Pedro. Durante
este período, continuou a exploração da costa africana, cada vez mais para sul,
com especial destaque para o golfo de Arguim, onde os portugueses fundaram um
importante posto comercial. A essa feitoria acabou por convergir um enorme
fluxo de mercadorias e informações, intensificando e alargando cada vez mais o
comércio à iniciativa privada. No fim desta etapa, o Atlântico assume uma
enorme importância económica para o reino. Os navegadores sulcam vastas áreas
do Oceano, compreendidas entre Portugal continental, ilhas (Madeira e
particularmente Açores) e costa de África (especialmente a fortaleza de
Arguim).
Com
a morte de D. Pedro, assiste-se a um período de considerável abrandamento nas
missões de exploração e comércio. Afonso V, rendido à nobreza nobiliárquica,
belicista,
decadente e pouco vocacionada para as actividades mercantis, opta por uma
guerra de conquista no norte de África, teoricamente mais favorável aos cofres
do reino, em detrimento das novas descobertas a sul da Serra Leoa. Concede esta
tarefa, juntamente ao monopólio do comércio da região, a Fernão Gomes, a troco
de uma quantia de 200 000 reis. O monarca inicia então uma série de campanhas
militares em Marrocos. Conquista Alcácer Ceguer (1458), Anafé (1464), Arzila
(1471), Tanger e Larache. Os motivos impulsionadores desta autêntica cruzada
africana estiveram relacionados com a conjuntura internacional da época. A queda
de Constantinopla (1453) leva o papa Calisto III a apelar aos reis católicos
que travem guerra ao infiel onde quer que este se encontre. Este estado de
guerra permanente, contra os mouros e no fim do seu reinado contra Castela,
deixará o reino muito debilitado economicamente. Coube ao seu filho, futuro D.
João II, equilibrar de novo as contas do reino, retomando a empresa da expansão
e dos descobrimentos. Para isso ordena a fortificação da feitoria de S. Jorge
da Mina, transformando-a no maior pólo comercial português, o mais pulsante
centro económico do reino. Desde 1474 que o soberano tomou todas as medidas
para passar o controlo efectivo do comércio ultramarino para as suas mãos, o
que permitiu a exclusividade da epopeia a Portugal. Esta fase termina em 1482.
Depois
de assegurado controlo régio sobre o comércio, partiu-se para a última fase da
expansão atlântica, a descoberta da passagem para o Índia. Esta seria
conseguida pelo sucessor de D. João II, D. Manuel I com o envio de uma armada
comandada por Vasco da Gama, no ano de 1497. Esta ultima etapa da chamada
expansão atlântica teve um cariz essencialmente exploratório e duraria até ao
ano de 1502/3.
Se
é verdade que fomos nós portugueses a desbravar o Atlântico e a respectiva
costa africana, tal não foi necessário após dobrar o cabo da boa esperança. O
Oceano Indico era já palco de movimentadas rotas comerciais. Existiam já
experimentados navegadores, aos quais Portugal apenas teve de assimilar os seus
conhecimentos.
Passamos
assim às fases de integração e conquista do Oriente. A primeira, compreendida entre
1500 e 1507/9. Durante esse período, procedeu-se ao domínio de uma serie de
bases terrestres com vista à estratégia marítima. Uma grande diferença,
enquanto no Atlântico as feitorias são locais de comércio fortificados, no
Indico são fortalezas onde se efectuam transacções comerciais. É que o comércio
do ouro e das especiarias estava nas mãos dos mouros e, estes não abdicaram
dele sem luta. Foi o que aconteceu em 1509 na grande batalha marítima de Diu,
onde o 1º vice-rei da Índia, D. Francisco de Almeida esmagou toda a
concorrência. Seguiram-se as conquistas de Goa (1510), Malaca (1511), Ormuz
(1515) e a ocupação de Diu (1535). Efectivou-se desta forma, a consolidação
bases
marítimas a par com a constituição de novas bases territoriais mais para o
interior. Portugal apostava assim em solidificar o controlo territorial com
vista à defesa efectiva do comércio ultramarino, abrindo as portas para o
domínio comercial português no Oriente.
Podemos
afirmar que a duas fases correspondem dois oceanos distintos. A fase atlântica,
onde as principais dificuldades se prendiam com a “virgindade” do território e,
a fase relacionada com o Oceano Indico, onde à semelhança do que aconteceu no
norte de África, os interesses previamente estabelecidos nos obrigaram a tomar
uma posição musculada de conquista pela força das armas.
Também
a estratégia delineada pelos vários monarcas foi consideravelmente diferente
nos dois espaços. No atlântico, em especial depois da descoberta do Brasil em
1500 por Pedro Álvares Cabral, a concessão de enormes espaços a senhorios quase
independentes é a marca dominante. No indico, face às necessidades de defesa
mais prementes, obrigou à nomeação de um vice-rei e governadores, com
competências especialmente no campo militar, mas também administrativas e
financeiras.
Desde
1415, com a conquista de Ceuta, até 1542, com a chegada dos navegadores
portugueses ao Japão, contabilizam-se 127 anos de epopeia, escrita por um povo
de qualidades ímpares, de onde sobressai a sua coragem inigualável. Qualquer
semelhança com o que somos hoje é pura coincidência.