terça-feira, 1 de abril de 2014

Os Níveis da Vida


"Todas as histórias de amor são potenciais histórias de dor. Se não no principio, depois. Senão para um, para o outro. Às vezes para ambos.".

É esta a premissa que abarca cada uma das páginas de mais uma excelente obra deste escritor britânico.

O primeiro capítulo descreve os primórdios do balonismo e da fotografia aérea. "Juntamos duas coisas que ainda não se tinham juntado. E o mundo transformou-se." A transformação moral destes pioneiros do ar, com o dilema da purificação da alma ao entrar no espaço divino ou a contaminação desse mesmo espaço ao ser invadido pela sua condição pecaminosa, são as duas abordagens possíveis para os que ousaram pela primeira vez a captação de imagens através da óptica de Deus.

"Juntamos duas pessoas que ainda não se tinham juntado; e às vezes o mundo transforma-se, outras vezes não. Podem despenhar-se e arder, ou arder e despenhar-se". Esta é a história de Fred Burnaby, um oficial britânico na reserva e a sua relação com a actriz francesa Sarah Bernhardt. Um cavalheiro com intenções sérias destinadas a uma mulher demasiado inacessível a compromissos.

 Por fim, e a título pessoal, na terceira parte do livro, Julian Barnes fala-nos do seu amor, mas especialmente da sua dor, essa dor que apenas os que amam verdadeiramente concebem significado. O sentimento de perda de quem sobrevive à existência da pessoa que nos completa, a angústia de quem passará o resto da vida fisicamente longe do objecto da sua paixão, a revolta e a frustração que brotam da questão sem resposta possível... Porquê?

Sem pretensões ou comparações, uma oferenda adequada para com quem partilhamos a nossa vida.



1 comentário:

Pantera Lusitana disse...

Li este livro numa pausa de outro que estou a ler. Que dizer deste belo e sofrido livro, que nos deixa a pensar e a refletir. Um livro sobre a dor e o amor, porque “todas as histórias de amor são potenciais histórias de dor”. E é nessa união de duas coisas que aparentemente não têm nada a ver uma com a outra, como balões e amor, que o livro se sobressai.

Na primeira parte, o fotógrafo Nadar, que registou a patente do «novo sistema de fotografia aerostática», e que assim fez as primeiras fotografias aéreas da história, e o seu amor pelo balonismo.
Na segunda parte, uma história de amor, mas sem um final feliz. A actriz Sarah Bernhardt «Serei sempre, como diz, balunática. Nunca embarcarei nessa máquina mais pesada que o ar», e o capitão Fred Burnaby «o malandro mais desleixado que alguma vez existiu».
Na terceira parte, Julian fala da perda da sua mulher, e o que isso provocou na sua vida, desde a ideia de suicídio que lhe passa inúmeras vezes pela cabeça, o esforço para continuar em frente, e relembrar como era estar com ela, o medo de a perder nas memórias e que os outros também a percam na memória. Um relato angustiante do autor perante a perda da sua companheira. Que nos transporta para a dor infinita perante uma "sombra" diária sem corpo. Uma escrita simples com elevado significado, que consegue que o leitor o acompanhe, de forma intensa, que nos envolve na sua perda. Temos a sensação de perda, mesmo quando foi algo que nunca tivemos. E que nos finda desta forma, para uma daquelas frases que não quero esquecer! "... às vezes resulta, e algo de novo se faz e o mundo transforma-se. Então, a dada altura, mais cedo ou mais tarde, por esta ou aquela razão, um deles é levado. E aquilo que é levado é maior do que a soma do que lá estava. Isto pode não ser matematicamente possível, mas é emocionalmente possível.”

Foi a minha estreia com este autor, não estava à espera de que este livro fosse autobiográfico, fiquei surpresa, à medida que o autor partilha os seus sentimentos de perda, as suas definições de desgosto e de luto, o que sentiu nos anos seguintes à morte da mulher Pat, não consegui largar o livro e acabei mesmo por ter umas lágrimas nos olhos.

Esta pequena e grande oferenda para reler e guardar toda a vida, com quem partilhamos a nossa vida.