sábado, 17 de agosto de 2013

Portugal e os Descobrimentos (1411-1542)


Em 1411 D. João I assina a paz com Castela. Depois de uma longa guerra surge finalmente a paz com o único reino com que partilhávamos as nossas fronteiras. Restava apenas o oceano e, foi para aí que o monarca português voltou as suas atenções.
Em 1415 uma armada portuguesa conquista a cidade de Ceuta. Os motivos oficiais que levaram a tal demanda prenderam-se essencialmente com motivos de ordem religiosa. A conquista de territórios ao infiel em nome de Deus foi o principal, havendo outros, como a necessidade de um feito militar para armar os infantes em cavaleiros do reino. No entanto, forças mais poderosas impulsionaram a expansão portuguesa em Marrocos. À partida, as pressões da burguesia comercial e da nobreza. A primeira sempre ávida pelo lucro potenciado na conquista de novos mercados e, a segunda, pelas mercês, senhorias e a riqueza do saque que a paz lhes negava. A juntar a tudo isto temos a importância estratégica da cidade, que influenciou a manutenção da mesma pelas forças portuguesas. Ceuta providenciava apoio logístico de vital importância ao reino de Granada, assim como aos piratas muçulmanos que muito prejuízo causavam a Portugal. Ficaram desta forma protegidas as rotas marítimas comerciais ibéricas e a actividade piscatória. Também foi tido em conta que a presença portuguesa em Marrocos seria um entrave às pretensões Castelhanas aos territórios a sul, ou que permitiria boas bases logísticas de apoio à futura expansão atlântica. Também o fervor religioso no combate ao infiel as novas oportunidades de comércio e corso, terá pesado na decisão de manter uma forte presença portuguesa em Marrocos. Em suma, existiu uma conjuntura de interesses económicos, de estratégia político-militar e religiosos que viriam a marcar não só o início da expansão portuguesa em Marrocos, como também toda a história dos descobrimentos portugueses.
Assistiu-se pois, no período seguinte à conquista de Ceuta, à primeira etapa de integração na chamada “expansão atlântica”. Nesta etapa estiveram em confronto duas correntes, com dois protagonistas distintos, a nobreza e a burguesia. Aos primeiros movia-os uma sede de conquista através da acção militar, aos segundos o lucro da actividade mercantil.
A D. João I sucede D. Duarte, que continua a apoiar a exploração marítima e as conquistas em África. Figura fulcral nesta política foi o seu irmão, o Infante D. Henrique que, fixando-se em Sagres articula e coordena as diferentes expedições exploratórias de além-mar. O reinado de D. Duarte fica no entanto marcado pelo desastre da expedição a Tanger em 1437, onde as forças portuguesas foram derrotadas, deixando em cativeiro D. Fernando, irmão de D. Duarte. Este viria a morrer em cativeiro. D. Duarte faleceu ainda antes deste, deixando nas mãos de D. Leonor a regência do reino, uma vez que o seu sucessor, Afonso V, tinha na altura seis anos.
O conflito de interesses entre a nobreza e a burguesia pende decisivamente para o terceiro estado ao forçar a entrega da regência do reino das mãos de D. Leonor para D. Pedro, opositor de uma campanha militar continuada em Marrocos. Esta etapa fica também marcada pala descoberta das ilhas da Madeira (1419) e dos Açores (1427), assim como a passagem do cabo Bojador por Gil Eanes (1434). É pois um período de consolidação através da exploração geográfica das novas áreas como de inovações técnicas que permitiriam aos navegadores portugueses uma boa base de partida para o futuro dos descobrimentos portugueses.
A segunda etapa decorreu entre 1440 e 1449, ano em que faleceu D. Pedro. Durante este período, continuou a exploração da costa africana, cada vez mais para sul, com especial destaque para o golfo de Arguim, onde os portugueses fundaram um importante posto comercial. A essa feitoria acabou por convergir um enorme fluxo de mercadorias e informações, intensificando e alargando cada vez mais o comércio à iniciativa privada. No fim desta etapa, o Atlântico assume uma enorme importância económica para o reino. Os navegadores sulcam vastas áreas do Oceano, compreendidas entre Portugal continental, ilhas (Madeira e particularmente Açores) e costa de África (especialmente a fortaleza de Arguim).
Com a morte de D. Pedro, assiste-se a um período de considerável abrandamento nas missões de exploração e comércio. Afonso V, rendido à nobreza nobiliárquica, belicista, decadente e pouco vocacionada para as actividades mercantis, opta por uma guerra de conquista no norte de África, teoricamente mais favorável aos cofres do reino, em detrimento das novas descobertas a sul da Serra Leoa. Concede esta tarefa, juntamente ao monopólio do comércio da região, a Fernão Gomes, a troco de uma quantia de 200 000 reis. O monarca inicia então uma série de campanhas militares em Marrocos. Conquista Alcácer Ceguer (1458), Anafé (1464), Arzila (1471), Tanger e Larache. Os motivos impulsionadores desta autêntica cruzada africana estiveram relacionados com a conjuntura internacional da época. A queda de Constantinopla (1453) leva o papa Calisto III a apelar aos reis católicos que travem guerra ao infiel onde quer que este se encontre. Este estado de guerra permanente, contra os mouros e no fim do seu reinado contra Castela, deixará o reino muito debilitado economicamente. Coube ao seu filho, futuro D. João II, equilibrar de novo as contas do reino, retomando a empresa da expansão e dos descobrimentos. Para isso ordena a fortificação da feitoria de S. Jorge da Mina, transformando-a no maior pólo comercial português, o mais pulsante centro económico do reino. Desde 1474 que o soberano tomou todas as medidas para passar o controlo efectivo do comércio ultramarino para as suas mãos, o que permitiu a exclusividade da epopeia a Portugal. Esta fase termina em 1482.
Depois de assegurado controlo régio sobre o comércio, partiu-se para a última fase da expansão atlântica, a descoberta da passagem para o Índia. Esta seria conseguida pelo sucessor de D. João II, D. Manuel I com o envio de uma armada comandada por Vasco da Gama, no ano de 1497. Esta ultima etapa da chamada expansão atlântica teve um cariz essencialmente exploratório e duraria até ao ano de 1502/3.
Se é verdade que fomos nós portugueses a desbravar o Atlântico e a respectiva costa africana, tal não foi necessário após dobrar o cabo da boa esperança. O Oceano Indico era já palco de movimentadas rotas comerciais. Existiam já experimentados navegadores, aos quais Portugal apenas teve de assimilar os seus conhecimentos.
Passamos assim às fases de integração e conquista do Oriente. A primeira, compreendida entre 1500 e 1507/9. Durante esse período, procedeu-se ao domínio de uma serie de bases terrestres com vista à estratégia marítima. Uma grande diferença, enquanto no Atlântico as feitorias são locais de comércio fortificados, no Indico são fortalezas onde se efectuam transacções comerciais. É que o comércio do ouro e das especiarias estava nas mãos dos mouros e, estes não abdicaram dele sem luta. Foi o que aconteceu em 1509 na grande batalha marítima de Diu, onde o 1º vice-rei da Índia, D. Francisco de Almeida esmagou toda a concorrência. Seguiram-se as conquistas de Goa (1510), Malaca (1511), Ormuz (1515) e a ocupação de Diu (1535). Efectivou-se desta forma, a consolidação bases marítimas a par com a constituição de novas bases territoriais mais para o interior. Portugal apostava assim em solidificar o controlo territorial com vista à defesa efectiva do comércio ultramarino, abrindo as portas para o domínio comercial português no Oriente.
Podemos afirmar que a duas fases correspondem dois oceanos distintos. A fase atlântica, onde as principais dificuldades se prendiam com a “virgindade” do território e, a fase relacionada com o Oceano Indico, onde à semelhança do que aconteceu no norte de África, os interesses previamente estabelecidos nos obrigaram a tomar uma posição musculada de conquista pela força das armas.
Também a estratégia delineada pelos vários monarcas foi consideravelmente diferente nos dois espaços. No atlântico, em especial depois da descoberta do Brasil em 1500 por Pedro Álvares Cabral, a concessão de enormes espaços a senhorios quase independentes é a marca dominante. No indico, face às necessidades de defesa mais prementes, obrigou à nomeação de um vice-rei e governadores, com competências especialmente no campo militar, mas também administrativas e financeiras.
Desde 1415, com a conquista de Ceuta, até 1542, com a chegada dos navegadores portugueses ao Japão, contabilizam-se 127 anos de epopeia, escrita por um povo de qualidades ímpares, de onde sobressai a sua coragem inigualável. Qualquer semelhança com o que somos hoje é pura coincidência.